Investidor ou Especulador? 3 Lições de Benjamin Graham

Autor: Igor Moreno da Silva

Comumente, o termo “Investidor” é atribuído a toda e qualquer pessoa que aloca parte de seu patrimônio em ativos visando a obtenção retorno financeiro, como por exemplo ações na bolsa de valores. Muitos dos detentores de ações não se dão conta de que, por vezes, se comportam como especuladores quando acreditam estar realizando investimentos. A diferença semântica pode ser pequena, porém os resultados de ditos comportamentos podem ser bem diferentes.

Como nos ensina Benjamin Graham em seu mais famoso livro O Investidor Inteligente, é natural que, na maior parte do tempo, comprar ações envolverá algum grau de especulação. Porém, “é papel do investidor manter esse fator especulativo dentro de limites estreitos e estar preparado financeira e psicologicamente para resultados adversos que possam ser de curta ou de longa duração.”

A especulação em si não é problemática, ilegal ou imoral. Porém, para a grande maioria das pessoas, ela tampouco gera retornos favoráveis. Ainda, é natural que algumas pessoas possam gostar de especular ou, melhor dizendo, apostar.

Formas de especulação

Deve-se fazer especulação de forma consciente e atentar-se para as formas mais comuns de especular de forma, segundo Graham, “pouco inteligente”:

1. Especular quando você pensa estar investindo

2. Especular seriamente, e não como passatempo, quando você não possui conhecimento e habilidades para tal;

3. Arriscar mais dinheiro na especulação do que você tem condições de perder.

Deve-se sempre ter em mente que, mesmo os melhores analistas financeiros e os melhores gestores de fundos, normalmente com muito mais recursos que investidores individuais, não tem capacidade de prever o futuro do mercado financeiro por uma razão muito simples: o futuro é imprevisível. Basta uma rápida pesquisa na internet para encontrar diversas projeções feitas por profissionais entre Dezembro 2019 e Janeiro 2020, prevendo que o Ibovespa alcançaria 150 mil pontos em 2020 (após um pico de 118 mil pontos alcançado em Janeiro de 2020, o índice desceu a 66.9 mil pontos em Março 2021, assim que a criticidade da pandemia eclodiu). Para quem pensa que esse foi um evento extremamente atípico, vale lembrar que não somente pandemias podem derrubar preços dos ativos: discursos políticos, desastres naturais, crises financeiras (dificilmente previstas) – a lista é infinita e, com certeza, há fatores adicionais que até hoje não vivemos o suficiente para observá-los e, assim, incluí-los nessa lista (para detalhes sobre este raciocínio, recomendo a teoria do Cisne Negro, do professor e filósofo Nassim Taleb).

Sendo assim, se você está comprando uma ação pensando em vendê-la em alguns dias, semanas, ou até meses, você está muito provavelmente agindo como um especulador, já que, apesar de ser possível buscar empresas com bons fundamentos, empresas com capacidade de retornos sustentáveis e de longo prazo, não é possível prever o comportamento do mercado que, em momentos de crise ou stress intenso, costuma agir de forma irracional: novamente faço menção à crise de 2020, que fez com que muitos investidores vendessem suas posições por medo e incerteza e, com isso, mesmo papéis de empresas pouco afetadas pela crise – ou até mesmo beneficiadas – sofreram reduções de preços.

Em 2018, um estudo liderado por Peko Hosoi, professora de engenharia mecânica e codiretora do laboratório de esportes no MIT, visava compreender a proporção de sorte em comparação à habilidade necessária para jogadores de Fantasy Games obterem bons resultados. Para quem não conhece, um Fantasy Game é um jogo onde você pode montar seu próprio time (comprando jogadores cujos preços fictícios variam) e os resultados de sua performance são apurados com base nos resultados reais dos campeonatos, seja NBA (Basquete), NHL (Hockey), NFL (Futebol Americano), etc. No Brasil, o mais famoso é o Cartola F.C., criado e mantido pelo site Globo.com. Ou seja, basicamente você aposta em quais jogadores terão uma boa performance em cada rodada. Para colocar os resultados em perspectiva, o estudo comparou os dados de Fantasy Games com mercado de ações, corrida de bicicleta, cara ou coroa, e esportes reais (proporção de sorte em comparação à habilidade um jogador ou time profissional). Para surpresa de alguns, mas provavelmente não de Graham, o estudo concluiu que, dentro de um espectro, a proporção de habilidade exigida por Fantasy Games e esportes reais é maior que a exigida para se gerenciar fundos mútuos (foram considerados dados de 44,938 fundos, de 2005 a 2015), como é mostrado na figura abaixo:

Valores R* computados para fantasy games, esportes reais, corrida de bicicleta (cyclocross), cara ou coroa (Coin Flipping), e fundos mútuos (mutual funds). Jogos de pura sorte estão posicionados à esquerda, e jogos de pura habilidade à direita. Os ícones de esportes em azul representam fantasy games e os ícones em preto representam esportes profissionais.

Estudo original e completo: https://dspace.mit.edu/bitstream/handle/1721.1/119466/16m1102094.pdf?sequence=1&isAllowed=y

Dicas

Se você, assim como eu, gosta de testar sua sorte na especulação, vale algumas dicas que Graham nos deixou há algumas décadas:

  1. Separe uma parte – quanto menor, melhor – de seu capital em uma conta específica para esse propósito.
  2. Nunca acrescente dinheiro a essa conta apenas porque o mercado subiu e os lucros estão jorrando (esse é o momento para pensar em sacar parte dos recursos do fundo especulativo)
  3. Nunca misture suas operações especulativas com seus investimentos em uma mesma conta, tampouco em qualquer parte de seu pensamento.

Apesar de escritas no século passado, acredito que as dicas de Graham são mais atuais do que nunca, já que nunca se esteve tão fácil comprar e vender ações: basta poucos cliques no celular e, uma vez a ação comprada, é possível acompanhar em tempo real o quanto se está ganhando ou perdendo. Existem hoje muitos investidores experientes criticando a forma como algumas corretoras incentivam a especulação, seja pela forma como o aplicativo é apresentado (segundo eles, similar a um cassino), seja pela facilidade de se fazer operações de altíssimo risco, como por exemplo opções.

O objetivo deste artigo é conscientizar o leitor a pensar sobre seu comportamento ao investir, já que, de acordo com dados divulgados pela agência britânica de notícias Reuters, a tendência de um comportamento “curto-prazista” tem aumentado nas últimas décadas. Como podemos observar no gráfico abaixo, o tempo médio que uma ação é retida por um investidor (holding period) era de aproximadamente 8 anos na década de 60 e vem caindo desde então, chegando finalmente, em 2020, a um período médio de menos de um ano.

Caso você, após refletir, decida destinar parte de sua carteira à especulação, o faça de forma consciente e, mais importante, não se esqueça das três dicas de Graham destacadas acima. Dito isso, boa sorte!

Sobre o autor: Igor é auditor interno e contador. De hobby, adora viajar e conhecer lugares diferentes.
LinkedIn: https://www.linkedin.com/in/igor-moreno-da-silva-696aa232

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